Fui para a Gulbenkian cheio de vontade de gostar e gostei. Bem sei que sou suspeito, que "Don Carlo" é a minha ópera preferida de Verdi; longa como convém, ao menos sai-se de barriguinha cheia. Mais ainda se a esplêndida orquestra do Met é dirigida por um jovem enérgico como Yannick Nézet-Séguin, de quem eu nunca antes tinha ouvido falar.
 |
| Yannick Nézet-Séguin |
Agora, os técnicos de som responsáveis pelas transmissões em directo do Met deviam rever a questão das vozes. Se a voz desinteressante e incaracterística de Poplavskaya é pequena e a de Keenlyside talvez também não seja muito grande, já as de Alagna e de Smirnova são enormes e surgiram com um volume quase assustador por cima da orquestra. Dito isto, vamos ao que interessa, que já passou mais de uma semana.
 |
| Simon Keenlyside |
O mais gratificante foi rever Roberto Alagna (Carlo) num dos papéis da sua vida e notar que recuperou a forma. Sem a frescura de há catorze anos, esteve glorioso nas cenas com Keenlyside (Rodrigo) mas não só. Disse o crítico a propósito da estreia: whenever he was joined by the baritone Simon Keenlyside, who sang Rodrigo, the Marquis of Posa and Carlo’s devoted friend, Mr. Alagna opened up in every way.
Keenlyside convenceu mais pelas suas excelentes capacidades cénicas que vocalmente. Esteve muito bem no primeiro dueto com Carlos e, no IV acto, excedeu-se na cena da morte.
Não encontro expressividade nem voz em Marina Poplavskaya (Elisabetta) que justifiquem o seu sucesso em Londres e Nova Iorque. No tempo em que vivemos, o da ditadura do visual, talvez a principal razão seja a sua figura ficar bem no ecrã. Eu prefiro uma cantora que tenha voz para o papel.
A personagem da Princesa de Eboli foi interpretada por Anna Smirnova, dona de uma voz impressionante mas pouco flexível e por vezes fora de tom e descontrolada, como no terceto com Carlos e Rodrigo - Trema per te.
O duelo dos baixos Ferruccio Furlanetto (Filipe II) e Eric Halfvarson (Grande Inquisidor) é um dos momentos-chave de "Don Carlo". Acontece imediatamente a seguir a Ella giammai m'amò, a grande ária do rei de Espanha. Não terá sido inesquecível, mas ambos cumpriram os respectivos papéis muito dignamente, embora de ambos já transpareça um certo cansaço vocal. Em 2008, em Londres, foi assim:
Pois é, Paulo, em algumas coisas concordamos, noutras não, mas foi um belo espectáculo. Venham mais assim. O que eu queria mesmo era vê-los pessoalmente, que aí é que se tiram dúvidas.
ResponderEliminarObrigada pelos links que me deram muito que ouvir e que ler.
Foi um belíssimo espectáculo, Gi. Relendo agora os aspectos negativos que apontei, se eu não soubesse que tinha gostado tanto até pensaria o contrário. Mas sim. Se apanhássemos este elenco por cá (eu mudava a Elisabetta e a Eboli, claro) estaríamos de grande.
ResponderEliminarSó por curiosidade, quem punhas tu, das cantoras actuais, a fazer a Elisabetta e a Eboli?
ResponderEliminarO resto do elenco bastava-me :-)
Ainda em relação ao teu primeiro comentário, tens toda a razão. Ao vivo é que se ouvê como são as vozes de facto. Com conhecimento de causa só posso falar de Alagna, de Halfvarson e de Tanovitsky (o Frade/Carlos V). Mas aviso-te já que não vou daqui até ali para ouvir a Poplavskaya.
ResponderEliminarA minha Eboli seria Ekaterina Gubanova. E a Elisabetta, a Matos, claro. Se ela não estivesse disponível, gostaria de reeditar Alagna/Mattila.
Hmmm... Eu ia ver isso, ia.
ResponderEliminarCaro Paulo,
ResponderEliminarComo sempre um comentário excelente, elucidativo e a fazer justiça aos outros que também comentaram. Como sabe, não pude assistir porque estive ausente (mas já tinha visto ao vivo esta produção), mas a leitura do seu texto faz-me reviver uma das boas experiências do passado.
Muito obrigado e bem haja.
[Oh diabo, eu aqui?]
ResponderEliminarBelíssimo post, belíssima crítica, óptimos links que atestam o dizer da Antuérpia: é por estas e por outras que o mundo não tomba.
Uma coisa é certa: foi uma tarde em cheio!
[Tu aqui, pois claro]
ResponderEliminarTem a Antuérpia muita razão e tu também. Foi uma belíssima tarde-noite.